Monografias em Foco - Cultura e Educação - opiniões científicas

EDUCAÇÃO E OS EMPECILHOS EPISTEMOLÓGICOS À COMPREENSÃO - ENSINAMENTO SOB O PONTO DE VISTA ÉTICO E CULTURAL
Elizângela Jackowski Pelissaro
 
Este artigo traz como tema principal a aplicabilidade da compreensão no sistema educacional e para melhor entendimento do assunto é indispensável mencionar que a compreensão é a um só tempo meio e fim da comunicação humana. A situação é paradoxal, pois as interdependências multiplicaram-se e a consciência de ser solidários atualmente une os humanos de forma que se tornem inseparáveis.
O problema da compreensão é dividido entre o global: compreensão entre humanos, os encontros e relações que se multiplicam entre pessoas, culturas, povos de diferentes origens culturais e o individual: relações particulares entre próximos. Estas estão cada vez mais ameaçadas pela incompreensão.
Quanto à proposição "quanto mais próximos estamos, melhor compreendemos" é apenas uma verdade relativa à qual se pode opor a proposição contrária "quanto mais estamos próximos, menos compreendemos", já que a proximidade pode sustentar mal-entendidos como: ciúmes e hostilidades, mesmo nos meios aparentemente mais evoluídos intelectualmente.
Diante de tal contexto, a comunicação não garante a compreensão.
A informação quando é transmitida e compreendida de forma adequada traz a inteligibilidade, que é a capacidade de perceber e compreender bem as coisas, dada toda a complexidade e pluralidade do mundo, como primeira condição necessária, mas não suficiente, para a compreensão absoluta.
Face às constantes modificações e o envolvimento com a quantidade de informações disponíveis e a insuficiência de tempo tendem a reduzir a probabilidade de inteligibilidade
.
Consoante discorre Morin, há duas formas de compreensão, a saber:

"a compreensão intelectual ou objetiva e a compreensão humana intersubjetiva. Compreender significa intelectualmente apreender em conjunto, comprehendere, abraçar junto (o texto e seu contexto, as partes e
o todo, o múltiplo e o uno). A compreensão intelectual passa pela inteligibilidade e pela explicação".2

Explicar é avaliar o que é preciso conhecer como objeto e aplicar-lhe todos os meios objetivos de conhecimento. A explicação é necessária para a compreensão intelectual ou objetiva, mas é importante saber que a compreensão humana vai além da explicação.

Portanto, a explicação é suficiente para a compreensão intelectual ou objetiva das coisas anônimas ou materiais, entretanto é insuficiente para a compreensão humana. Esta comporta um conhecimento de sujeito a sujeito. Fundamentalmente, compreender inclui um processo de empatia, de identificação e de projeção.
Por ser sempre intersubjetiva a compreensão pede acesso, afabilidade e simpatia.

Há múltiplas limitações exteriores à compreensão intelectual, como: o ruído; a polissemia; a ignorância dos ritos e costumes do outro, principalmente sobre as variedades culturais; a incompreensão dos valores imperativos disseminados em outra cultura; a incompreensão dos imperativos éticos próprios a uma cultura, como o imperativo da lei nas sociedades evoluídas; a impossibilidade, enquanto visão de mundo, de compreender as idéias e os argumentos de outra visão; e, a impossibilidade de compreensão de uma estrutura mental em relação à outra.

Além dos empecilhos intrínsecos e da indiferença tem-se o egocentrismo, o etnocentrismo e o sociocentrismo que têm como finalidade se situarem no centro do mundo e considerar como secundário, insignificante ou hostil tudo o que é estranho ou distante.

Consoante Edigar Morin, os obstáculos à compreensão são múltiplos e multiformes: os mais graves são constituídos pela cadeia egocentrismo/autojustificação/
self-deception, pelas possessões e reduções, assim
como pelo talião e pela vingança - estruturas arraigadas de modo indelével no espírito humano, que ele não pode arrancar, mas que ele pode e deve superar.3

Ressalta-se que a conjuntura das incompreensões, intelectual e humana, individual e coletiva, constitui impedimentos maiores para o progresso das relações entre indivíduos, grupos, povos e nações.

Não são exclusivamente as vias econômicas, jurídicas, sociais e culturais que facilitam as vias da compreensão. É preciso também recorrer a vias intelectuais e éticas, que podem desenvolver a dupla compreensão, intelectual e humana.

A ética da compreensão pede que se compreenda a incompreensão porque aquela é a arte de viver que demanda, em primeiro lugar, compreender de maneira desinteressada. Isto exige enorme empenho, pois não pode esperar nenhuma reciprocidade. Compreender aquele que é incapaz de compreender é compreender as origens, as formas e as demonstrações da intolerância humana.

Concomitantemente a ética requer que se argumente e que se refute em vez de excomungar e anatematizar. Encerrar na noção de traidor o que decorre da inteligibilidade mais ampla impede que se reconheçam o erro, os desvios e as ideologias.

Sobrevem que a compreensão não acusa nem desculpa, unicamente pede que se evite a condenação definitiva, ou seja, irremediável. Se as pessoas aprenderem o significado de compreender antes de condenar estarão no caminho da humanização das relações humanas.

O conhecimento científico não pode tratar sozinho dos problemas epistemológicos, éticos e filosóficos, sendo que a educação deve ter por espoco, dedicar-se, por conseguinte, à identificação da origem de cegueiras, erros e ilusões que estão resultando nesta falha cognitiva da compreensão humana.

Apropriadas são as palavras de Edgard de Assis Carvalho, em
consonância com as idéias de Edgar Morin:

... é imperioso praticar a auto-ética, como uma espécie de arte articulada à ética política, construída a partir de seis idéias-guia que, para Morin, são fundamentais para a "restauração do sujeito responsável": a ética do religamento, a ética do debate, a ética da compreensão, a ética da magnanimidade, a ética da resistência e a incitação às boas vontades.

Esse ideário pode ser concebido como um arquétipo, ou seja, uma forma irrepresentável e inconsciente que sempre existiu, mas que perdeu sua capacidade de influenciar os comportamentos humanos. Como força energética, precisa ressincronizar-se, readquirir voz, manifestar-se como fenômeno cognitivo, fazer jus à natureza psicóide do arquétipo que aponta para o
unus mundus (o mundo unitário), circundado por uma responsabilidade coletiva generalizada, capaz de construir uma ética societal que respeite o homem, a vida e a liberdade planetárias, e estimular a consciência de pertencimento à Terra-Pátria4.

Pontualmente, a compreensão entre sociedades presume sociedades democráticas abertas, o que significa que a trajetória da compreensão entre culturas, povos e nações passa pela generalização destas sociedades.

Mas não se pode esquecer que, mesmo nestas sociedades permanece o problema epistemológico da compreensão.

Pode-se afirmar que para haver compreensão entre estruturas de pensamento é preciso passar à metaestrutura do pensamento que compreenda as causas da incompreensão de umas em relação às outras e que possa ultrapassá-las.

Face o exposto conclui-se que a educação para a compreensão encontra-se ausente no sistema de ensino e percebe-se que a humanidade necessita, em todos os sentidos, de compreensão mútua, mas que hordiernamente a sociedade está desprovida desta imperativa necessidade.

Considerando a importância da educação para a compreensão, em todas as idades e em todos os níveis de educação, o desenvolvimento da
compreensão pede o aperfeiçoamento para a reforma das mentalidades e como consequência esta deve ser a tarefa da educação do futuro.

Singular atenção merece o debate concernente sobre os equívocos apontados ao longo da construção da ciência, que foram desconhecidos ou omitidos pela história tradicional, podem ajudar a encontrar os vários empecilhos epistemológicos surgidos ao longo da história da ciência, possibilitando assim, um melhor conhecimento do trajeto percorrido pela ciência.

Diante deste panorama de ineficiência, a compreensão mútua entre os seres humanos, sejam eles próximos ou estranhos, é fundamental doravante, para que as relações humanas saiam de seu estado primitivo de incompreensão. Deste ponto decorre a necessidade de estudar a incompreensão a partir de suas origens, modalidades e implicações.

Convém salientar que este estudo é imprescindível porque tem a responsabilidade de enfocar não os sintomas, mas as causas desta aversão e desconsideração. O que acabaria por instituir e estabelecer, ao mesmo tempo, uma das bases mais seguras da educação para a paz, à qual se deve estar ligado por essência e aptidão.

Em síntese uma pessoa para compreender tem que estar estreitamente conectada ao processo de transformação do mundo.

O ensinamento da compreensão requer empatia, abertura e generosidade. Por outro lado, o egocentrismo, o etnocentrismo e o sociocentrismo reduzem conhecimentos complexos a impressões pré-concebidas e para que não se sucumba à fragmentação e aos paradoxos neoliberais que globalizam de um lado e excluem do outro é necessário assumir esse desafio cognitivo.

Por fim a educação do futuro deve prestar atenção não somente nos obstáculos à compreensão, mas principalmente às metaestruturas de pensamento exigindo um esforço transdisciplinar para unir ciências e humanidades para que a oposição entre natureza e cultura acabe.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:


CARVALHO, Edgard de Assis.
Mal-estar civilizatório e ética da compreensão. São Paulo Perspec. v. 13, n. 3. Disponível em: <http://www.scielo.br>. Acesso em: 21 ago. 2010.

MORIN, Edgar.
Os sete saberes necessários à educação do futuro. 8. ed. São Paulo: Cortez; Brasília: UNESCO, 2003.
 


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